segunda-feira, 17 de outubro de 2011

The Book of Mormon: O musical.

No início deste ano estreou na Broadway o musical The Book of Mormon. O musical foi idealizado e escrito em maior parte pelos criadores do desenho South Park, e seu foco é uma enorme sátira às religiões organizadas, porém, neste caso, as peculiaridades da Igreja de Jesus Cristo dos Santos do Últimos Dias foram tomadas como base para o desenrolar do musical.

Para quem não conhece, o desenho South Park coloca em prática o que podemos chamar de humor limítrofe, ou seja, um humor que equilibra-se na tríplice fronteira entre a tosquisse, a ofensa e a mais sagaz genialidade, e não estou sendo exagerado quanto ao item genialidade, não raro quis parar de pé em frente ao computador e aplaudir o streaming que era exibido na tela do meu computador. Em algumas entrevistas dos autores, como esta, eles comentam o desejo de falar sobre coisas das quais ninguém fala e fazer um humor que ninguém faz, ir até onde ninguém vai (e talvez até ficar lá por uns bons momentos, por que não ?). As sátiras vão desde qualquer religião até os ateus, passando por questões políticas e sociais extremamente relevantes para o nosso tempo.

Assim, este musical não poderia ser diferente. Vencedor de 9 Tony Awards, o Oscar dos musicais, incluindo o de melhor musical, os ingressos para as 8 exibições semanais estão esgotadas para os próximos 5 meses (!). Nem os próprios autores acreditavam que o sucesso seria tão grande, um legítimo blockbuster. O que fez este musical este sucesso ? Músicas ótimas, atores ótimos, tema inédito. Há quem diga que trata-se do melhor musical norte-americano dos últimos 25 anos ou simplesmente o melhor musical deste século, não conheço nada de musicais mas este definitivamente é ótimo.

A história desenrola-se com dois missionários mórmons — como se sabe eles sempre andam em duplas — que são sorteados para irem à África, mais especificamente, Uganda. Ele então descobrem que a África não é exatamente como no Rei Leão e acabam sendo expostos às varias mazelas africanas: fome, Aids, guerras, violência em geral, doenças que poderiam ser curadas com remédios que custam centavos de dólar, etc. Diga-se de passagem, alguns cristãos ainda acreditam que estas mazelas sejam coisas destinadas por Deus àquele continente (um castigo pelo ocultismos/paganismos/não-cristianismos), e recentemente tivemos uma declaração neste sentido de um deputado sobre a qual escrevi aqui no blog.

Na África os missionários passam por diversas situações, como a de conhecer a música de alento dos Ugandenses, Hasa Diga Eebowai (Fuck You, God), utilizada para praguejar um pouco contra Deus e aliviar as dores da existência, afinal não lhes resta melhor alternativa. Um dos momentos mais interessantes — se é que é possível selecionar algum pois é um sacada genial atrás da outra — trata-se da música I Believe (vide vídeo abaixo), que foi apresentada na cerimônia Tony Awards, nela o personagem Elder Price reafirma sua fé, destacando as coisas de sua fé cristã e mórmon na qual acredita inclusive que em '1978 Deus mudou de ideia sobre as pessoas negras, elas podem ser mórmons !'. Esta parte da música é uma referência ao fato da Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias não aceitar pessoas negras até o ano de 1978 (algumas vertentes ortodoxas ainda não aceitam).

Dentre os vários destaques que poderiam ser dados, sou forçado pela minha atração por vocais de cantoras negras a falar do merecidíssmo prêmio para Nikki M. James como melhor atriz coadjuvante. Sua performance na música Sal Tlay Ka Siti (um trocadilho com Salt Lake City, a capital do estado mórmon, Utah), joga o ouvinte da mais profunda emoção para risada de uma piada tosca como no trecho final da música "Mamãe você não mentiu, o lugar (do qual falavas) é real e eu irei voar. Eu estou no meu caminho, logo a vida não será tão cagada (shitty). Agora a salvação tem um nome: Sal Tlay Ka Siti". Além disso, devo mencionar as performances perfeitas e cheias de carisma dos protagonistas Andrew Rannells (Elder Price) e Josh Gad (Elder Cunningham) que além de ótimos atores, possuem vozes magnificas.

Para quem se ofende facilmente com ideias opostas às suas e/ou para quem é um cristão muito fervoroso, eu não recomendo. Mas, devo dizer, a própria Igreja Mórmon não fez nenhum comentário negativo quando perguntada sobre este musical, afinal os mórmons são todos super-legais. Todas as músicas podem ser escutadas oficialmente aqui (login no Facebook requerido para curtir a página) e não oficialmente via Youtube. Enjoy, brother !



6 comentários:

  1. Realmente esse musical é uma sacada de gênio! Como minha família é Mórmon, cresci vendo e ouvindo as mesmas coisas que eles encenam no palco, e realmente é bem assim que as coisas acontecem! Gostaria muito de ir ver o musial em NY.Parabéns pelo blog!

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  2. Muito bom, até porque volta e meia assisto alguns episódios do desenho... Vi outro dia o capítulo que fazia uma sátira pesada em torno da religião mormon, quase me matei de rir... Chamá-los (os criadores) de criativos é pouco, penso, assim como você, que se tratam de gênios ousados e que nos passam uma informação bacana sobre a "verdade" distorcida em viver de fato um mito, pois mito é mito, fato é fato... Entender tudo isso não é para qualquer escravo ideológico de mágicas clericais...
    Adorei o texto e vou ver os vídeos que postou!!!
    Abraço!!!

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  3. Que massa Dilso ! Os caras são gênios artísticos dos tempos atuais. Este episódio sobre os mórmons é muito legal. O melhor é que eles vão de ponta a ponta, qualquer crença, inclusive aquela de que o ateísmo por si só seria o melhor a 'solução' para humanidade, e isto, na minha opinião, é um baita mito ! :D

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  4. E eu que sou ateu heheheh... Tudo bem!!! Abraço!!!

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  5. Hehehe... mas normalmente ateus gostam da divergência de idéias (ou não :p)... Eu me considero agnóstico, mas já fui cristão protestante luterano, espírita e um quase-niilista... Simpatizo com a idéia do Matt Stone do South Park, que é de origem judia, ateu, mas gosta das histórias das religiões (afinal existe uma função orgânica nisto tudo :D).

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