segunda-feira, 2 de maio de 2011

Num cinema, em breve, ou apenas num papel, por enquanto

Selecionei alguns filmes - ou ideias de filmes - a caminho da telona, que rendem ou podem render alguma expectativa, seguidos por comentários. Quem quiser contribuir com algo que não possa permanecer sem lembrança e que minha memória não alcançou, à vontade! As traduções dos títulos originais são (quase sempre) minhas.

* A pele em que vivo (La piel que habito, 2011), de Pedro Almodóvar. Anunciado como incursão do renomado cineasta espanhol em uma narrativa de terror (o que eu duvido que aconteça no sentido literal que a classificação "terror" quase sempre implica, mas nem por isso distante da expressão "terror"), o longa trará um cirurgião plástico (interpretado por Antonio Banderas, que volta a colaborar com Almodóvar) que, sintam-se livres para imaginar o "como", busca vingar-se do homem que estuprou sua filha. O enredo é pesadíssimo. Vamos ver como o sempre inteligente novelo almodovariano desvela-se numa trama com densidade apavorante - e muitas metáforas. As primeiras fotografias divulgadas são belíssimas - como são bonitos os filmes de Almodóvar! No mínimo, será interessante apreciar o tratamento de imagem que o diretor dará tendo algo tão macabro no ínterim das ações. A fotografia é de José Luis Alcaine, a música é de Alberto Iglesias, o roteiro é do próprio cineasta e a produção, como sempre, é da El Deseo, gerenciada pelos Almodóvar. A primeira exibição oficial do filme ocorrerá daqui a alguns dias, no Festival de Cannes, que inicia em 11 de maio, mas a estreia na Espanha está prevista somente para setembro - o que significa que, no Brasil, poderá levar ainda mais tempo, se tudo ocorrer conforme não queremos.





* Yut doi jung si (2012). Não me atrevi a traduzir o nome do novo trabalho de Wong Kar-Wai, que trará o premiadíssimo ator chinês Tony Leung, ou Leung Chiu Wai, que não sei se é parente do diretor, encarnando Yip Man, mestre de Bruce Lee. Aliás, o cantonês, língua falada nos filmes de Kar-Wai, é tão complicado que nem o tradutor do Google teve atrevimento. Entretanto, os norte-americanos estão propagandeando o longa como The grand master, ou The grandmasters, algo como O mestre ou Os mestres, sugerindo que, ou Bruce Lee será também interpretado, o que é mais possível, ou que ele teve outros professores, o que estou desinformado. Difícil saber o que poderá ser o filme. O fato é que Kar-Wai há bastante tempo trabalha nas filmagens. Parece querer conciliar o cinema de estilo pancadaria que fazia no final dos anos oitenta/início dos noventa com aquele que o notabilizou anos depois e que o alçou à condição de um dos mais estimados e premiados diretores de cinema da atualidade. De qualquer forma, as coreografias estão sendo elaboradas por Yuen Woo-Ping, famoso diretor chinês de filmes de kung fu e mais famoso ainda colaborador de trabalhos como O tigre e o dragão, de Ang Lee, uma ótima fantasia capa-e-espada, Kill Bill, de Quentin Tarantino, e Matrix, dos irmãos Wachowski. Pelas imagens até agora divulgadas, acho que vale a expectativa, gerada principalmente pelo nome de seu diretor. Ainda não há previsão - o que é ótimo, porque deixa a equipe tranquila para pensar e criar. Fotografia de Philippe Le Sourd, música de Frankie Chan, roteiro de Wong Kar-Wai, Xu Haofeng e Jingzhi Zou e produção franco-chinesa.





 * Django liberto (Django unchained, 2012) é, provavelmente, o próximo filme de Quentin Tarantino. Aparentemente, o projeto toma o título de um clássico de 1966, Django, estrelado por Franco Nero, para brincar (sério) com conceitos cinematográficos em uma complicada engrenagem há tempos anunciada como ideia por Tarantino. Reiterando, a complexidade parece enorme: o tempo é aquele anterior à abolição norte-americana da escravatura. O espaço? Não o oeste, mas o sul dos Estados Unidos. O herói? Esqueça Eastwood; será um negro escravo. A trama? Como sempre, aparentemente banal, cômica, inventiva e repleta de peripécias. Diz-se que o tal escravo, talvez chamado Django, ou alcunhado Django, é na verdade ex-escravo: foi liberto. Mesmo assim, vive sob uma "tutela": um caçador de recompensas alemão, que será vivido por Christoph Waltz, o excelente Hans Landa de Bastardos inglórios, o transformou em mercenário (!). Django e o alemão tornam-se uma perigosa dupla em busca de dinheiro: roubando, matando e fazendo tudo aquilo que, em geral, recheia qualquer bang bang macarrão - mas com uma impagável pompa que, para nós, deverá ser deliciosa, em função da "história" ideológico-cultural por trás das personagens. A certa altura, a esposa de Django é, por alguma razão, raptada por um fazendeiro. Os motivos da dupla, antes, digamos, políticos, passam a ser pessoais, levando-a ao samaritano resgate da cônjuge. Nem tentem adivinhar mais do que pode estar por vir: aguardem. Há alguns dias Tarantino entregou uma versão (quase) completa do roteiro, mas deve estar repensando muitos aspectos do material e (re)assistindo tudo o que existe de bang bang. De qualquer forma, é sempre bom saber que a criatividade deste que considero um dos mais inventivos e saborosos diretores da atualidade parece ter o mesmo fôlego daqueles que não se cansavam de ir às grindhouses esperando, a cada dia, o seu filme, muito melhor que o anterior.


* J. Edgar (J. Edgar, 2012), dirigido pelo incansável Clint Eastwood, dará ênfase às muitas polêmicas que envolveram J. Edgar Hoover, que comandou durante décadas o FBI, a partir do início dos anos 20. O enredo abordará, por exemplo, a suposta homossexualidade omitida às vezes indiscretamente por Hoover, que provocou escândalos na terrinha do Tio Sam, cuja família, claro, só aceita heteros. O burocrata será vivido por Leonardo DiCaprio. A trama acompanhará, presumo, casos que envolveram desde o encalço a John Dillinger, que Michael Mann já abordou no ótimo Inimigo público, até o sequestro do filho do famoso aviador Charles Lindbergh, que mais tarde tornou-se suspeito de compactuar com o nazismo, o que será interessante, visto que Hoover tornou-se notável pelo combate que empreendeu contra aqueles que tomou por congressistas comunistas e aqueles acusados de serem espiões nazistas. Foi, inclusive, uma pedra no sapato de Martin Luther King, tamanha a desconfiança com que encarava os movimentos antirracistas. Bem, um filme de Clint Eastwood já é sempre mais que esperado, dada sua competência. A fotografia será de Tom Stern, a música, em composição e não divulgada, provavelmente será assinada pelo próprio cineasta, o roteiro é de Dustin Lance Black (do ótimo Milk) e a produção é uma parceria da Malpaso, gerenciada por Eastwood, com a Imagine, dos fanfarrões Brian Grazer e Ron Howard. Mas o velho Clint sempre consegue o que ele quer - after all, at least in theory, he always makes his day.

Outros projetos

* Há anos o cinema norte-americano almeja filmar uma cinebiografia, ou algo parecido, de Martin Luther King. Entretanto, todos que tornaram-se ícones de seu tempo ocasionam verdadeiras batalhas por lá quando fala-se em uma adaptação às telas. Parece que com Luther King a coisa é ainda mais séria, porque os detentores de seu espólio, ou seja, seus descendentes, querem preservar um imaginário que aparentemente não foi tão positivo quanto à assim denominada realidade da personagem. Três são os projetos que, no momento, envolvem Luther King - já foram quatro. Um deles, todavia, está pertíssimo de virar realidade. Vou falar um pouco, primeiro, sobre os desonrados. O primeiro, batizado Selma, pretendido por Lee Daniels (do fraquíssimo Preciosa) e bancado por Oprah Winfrey, não tem nada a ver com uma suposta amante de King (e dizem que ele teve várias). Selma é a cidade do Alabama, no sul, em que as divergências da segregação racial foram talvez as mais violentas. O enredo, entretanto, foca na relação entre King, no início de seu ativismo, Lyndon Johnson, então presidente norte-americano, e George Wallace, o irascível governador do Alabama, algoz de King. As filmagens foram suspensas e estão imprevisíveis por conta de o material incomodar os descendentes de King. O segundo já foi cancelado há algum tempo e chamava-se Luther. Quem estava tocando a ideia era Clint Eastwood, que depois parece ter passado a bola para Martin Scorsese, que não costuma lidar muito bem com burocracia e interrompeu, até a morte, a pré-produção. O terceiro ainda é possível de acontecer, mas é o mais polêmico, e, parece, aproxima-se do que era para ser Luther: Memphis, escrito e dirigido por Paul Greengrass (dos dois mais recentes Bournes). Greengrass, que desenvolveu uma pesquisa por conta própria, foi barrado na justiça pelos herdeiros de King ao apresentar material abordando as beberagens e puladas de cerca de Luther King - o que, a meu ver, não diminui em nada o que o pastor representa. Essa sim seria uma narrativa maravilhosa nas mãos de um Clint Eastwood. O quarto projeto, que está ganhando forma, tem em sua produção os próprios herdeiros (!). Além disso, são nada menos que três os estúdios envolvidos para trazê-lo à luz das câmeras, entre eles a DreamWorks, de Steven Spielberg, que nunca ouve "não". Não sei muito bem o enredo, mas é certamente o mais "estandártico", trazendo em seu bojo o famoso discurso I have a dream. Pois eu também tenho um sonho: um filme de Luther King sem politicagens; só arte.

* O livro World War Z, do debochado e criativo Max Brooks, vai virar filme estrelado por Brad Pitt e dirigido por Marc Forster (de mais baixos que altos). Ao que tudo indica, será um daqueles pipocões com quinhentos mil takes, mas a esperança de ver algo no mínimo com bom-humor é a última. Aliás, ultimamente projetos com zumbis só não têm superado, em número, os com vampiros - e prefiro, se é para me entreter, o incômodo à sedução. Quem quiser conferir ideias interessantes com mortos-vivos deve ficar atento ao mundo dos quadrinhos. Como tem sido hábito roteirizar com base nos quadrinhos - a nova mina de Hollywood -, espere que logo os zumbis tornar-se-ão, literalmente, um jorro para os fãs de mentes mais funestas.

* Por fim, ou por enquanto, compartilho o cartaz do novo filme de Woody Allen, Meia-noite em Paris (Midnight in Paris, 2011), de bela intertextualidade com Van Gogh.


O que será que o sensivelmente neurótico Allen quer insinuar com o pintor holandês? Veremos.




Um comentário:

  1. Grande post, amigão!
    Tem um conhecimento bem afinado, também, para o cinema. Para que te conhece isso não é nenhuma novidade. Interessantíssimo!!!
    Saudades, garoto!!!

    http://cronutopia.blogspot.com/

    ResponderExcluir